quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Elisa: Ivy (2010)

 Vocês viram no Piccoline #30 que o novo álbum de Elisa nos pegou no susto, apenas um ano após o lançamento do excelente Heart, cuja resenha você pode ver aqui.
Bom, a primeira impressão que tive ao ver o projeto gráfico do site especial do álbum foi "Ué? Mas é Lotus volume 2?". E o nome, Ivy, "hera" (a planta, não a deusa) em inglês, reforçou minhas suspeitas... Fiquei com a pulga atrás da orelha.

Lançaram o primeiro single, Nostalgia, em 30 de novembro e ouvi-o no mesmo dia. A sensação foi de "Ops? O que é isso? Parece com Broken, primeiro single de Lotus...". Quando finalmente ouvi o álbum completo minhas suspeitas se confirmaram. Ivy é uma espécie de sequência de Lotus, mas está longe de ser tão bom quanto seu antecessor. Bom, vamos lá destrinchar a 'criança'.

Lullaby é a canção que abre o álbum. Pode parecer inédita para algumas pessoas, mas se trata de uma canção lançada no single de Almeno Tu Nell'Universo. A música é linda, pouco conhecida, nunca foi lançada num álbum, e o clima etéreo tem muito a ver com a proposta de Ivy, então tudo bem.

A seguir vêm duas inéditas, Sometime Ago e Fresh Air. Ambas muito boas, coerentes com o que espero de Elisa num álbum acústico, mas inferiores ao que ela trouxe no álbum anterior ou, melhor comparando, no também acústico Lotus.

A quarta faixa é a releitura de Ti Vorrei Sollevare. Pra quê mexer nesse excelente dueto com Giuliano Sangiorgi, transformando-a num solo acústico bonitinho, mas sem nada de novo? Não entendi. E a próxima faixa, Una Poesia Anche Per Te, oriunda do álbum Pearl Days, me deixou com a mesmíssima sensação...

Então vem Nostalgia, o tal single parecido com Broken. Depois de ouvir inúmeras vezes, a música me pareceu mais simpática, mas ainda me lembra Broken.
Em seguida, vêm três releituras que seguem o caminho das já mencionadas Ti Vorrei Sollevare e Una Poesia Anche Per Te. Qualcosa Che Non C'È, sétima faixa, Rainbow, a oitava e Gli Ostacoli del Cuore, nona. Regravá-las para quê? E Rainbow, que já tinha versões normal e acústica em seu próprio álbum de origem, o Then Comes The Sun? Pra quê mais uma versão muito parecida com a acústica? Só aceitaria se fosse uma releitura rock, indiana, techno, axé music, qualquer coisa diferente... O mesmo para Gli Ostacoli Del Cuore, a excelente música em parceria com Ligabue, que ganhou uma releitura banal, inferior ao que ela merecia.
 
Agora entramos na parte dos covers. Elisa é muito boa fazendo covers, levando em consideração os anteriores, de Lotus (Femme Fatale, Hallelujah e Almeno Tu Nell'Universo) e Heart (Mad World). Por isso, quis acreditar que os covers salvariam Ivy do buraco negro onde ele estava se metendo. Não foi bem assim... Não conhecia nenhum dos originais, portanto, ouvi todos à exaustão para comparar com alguma propriedade.

1979, a décima faixa, é cover do Smashing Pumpkins. Achei que o original já não é lá muito bom, e a regravação sem personalidade é algo decepcionante, muito inferior ao que Elisa costuma fazer. Além de parecer uma sobra de estúdio que não se adaptou muito bem à proposta de Ivy.
Pour Que L'amour me Quitte é um cover de uma francesa, Camille, e abre-se com fofíssimas risadinhas da filha de Elisa, Emma Cecile. Trata-se de um dueto com Giorgia, que eu esperava ansiosamente, achando que seria o ponto alto do disco, visto que no concerto Amiche Per L'Abruzzo a apresentação das duas foi excelente. Mas também não foi bem assim... A música é boazinha, muito fofa, delicada. Mas novamente: é praticamente igual ao original da francesa. Então nesse ponto, eu comecei a me perguntar: cadê a personalidade? Cadê a inovação? Cadê a Elisa de sempre? A Elisa camaleoa? E duetar com Giorgia, notória pela potência vocal, numa cançoneta de ninar? Seria efeito da maternidade? Queria ver as duas numa música com agudos de estourar os tímpanos...

Depois da decepção com o dueto Elisa-Giorgia, vem Anche tu, anche se (non trovi le parole), releitura da recentíssima Anche Se Non Trovi Le Parole, com participação de Fabri Fibra, para quem torcia o nariz só de ouvir o nome. Sendo assim, já no primeiro acorde pensei: "Segura, que lá vem bomba!". Entretanto, surpreendemente, é essa música a que começa a salvar o disco. Ficou muito, muito bom o rap de Fabri entrecortando a parte cantada por Elisa. Esse sim é o ponto alto de Ivy. Vale a pena ouvir essa releitura digna da Elisa dos velhos tempos.
Depois dessa surpresa, vem a releitura de It Is What It Is, que também me agradou. Ficou diferente do original, que é mais sombrio e denso, e agora ganhou um ar etéreo, adaptando-se a Ivy de forma muito satisfatória. Gostei muito.
Aí o disco desliza de novo com Eppure Sentire (Un Senso di Te), uma das canções que eu mais amo no repertório da cantora de Monfalcone, mas que esbarra outra vez na tal da "releitura sem personalidade"... Dispenso sem dó e fico com a gravação original.
Seguem-se dois covers onde Elisa acerta. Ho Messo Via, décima quinta faixa, é cover do Ligabue, e graças a Deus, não decepciona. Ficou deliciosamente fofa, apesar de não tão diferente do original.
A décima sexta faixa, I Never Came, cover do Queens Of Stone Age, ficou bem gostosinho de ouvir. Quem dera Elisa tivesse acertado no album inteiro...
Fechando o disco, vem Forgiveness, em versão solo. Comentei na resenha de Heart que talvez se Elisa cantasse sozinha eu gostasse mais dessa música. Estava certa. A versão solo é infinitamente melhor. Gostei muito e ela encerrou bem um álbum fraco.
Antes de concluir a resenha, duas considerações. A primeira, sobre o projeto gráfico do álbum. A capa e a contracapa são lindas, elegantes, mas o interior é péssimo. A ideia de colocar o texto sobre um fundo de fotos de árvores tornou a leitura praticamente impossível. Se a intenção era mesmo essa, conseguiram. Quase não dá pra ler. Seria melhor se tivessem seguido a tendência clean da capa e mantivessem o interior branco.
E a segunda é sobre as releituras. São fracas, muito fracas, não surpreendem como surpreenderam as releituras feitas em Lotus. À exceção de Anche Se Non Trovi Le Parole, It Is What It Is e Forgiveness, todo o resto é absolutamente dispensável. Sinceramente, não entendo o sentido de fazer uma releitura e deixar a música praticamente igual ao que era. Ainda mais se tratando de músicas que foram lançadas praticamente ontem, como é o caso das que vieram de Heart. Meu conselho é: ouça os originais.
 
Para concluir, digo que Ivy pode ser definido em uma só palavra: desnecessário. No site oficial da cantora há um texto onde vangloriam-se por Ivy, com suas dezessete faixas, ser o álbum mais longo da carreira dela. Antes tivesse só as dez músicas que realmente valem a pena, ou melhor ainda, fosse um EP com os bons covers e as três inéditas. Ou, se era mesmo pra fazer o álbum mais longo da carreira, que se trabalhasse mais tempo e se investisse em releituras realmente boas, diferentes dos originais, com a qualidade das releituras de Lotus. Do jeito que Ivy foi lançado me parece só mais um álbum feito às pressas. Como fã de Elisa, é duro admitir isso, mas ela podia ter ficado de fora dessa onda que tomou a Itália e empurra álbuns goela abaixo, um atrás do outro. É triste ver bons artistas, com carreiras consolidadas, deixando-se levar pela indústria da música, lançando álbuns insossos, sem qualidade e sem personalidade. O caminho seria ou chutar tudo para o alto e se lançar como artista independente, como Massimo di Cataldo, ou fazer a linha Gigi D'Alessio que, apesar de precursor da onda um-disco-por-ano-ou-mais, tem lançado EPs no lugar de álbuns completos. Com isso, tem feito bons trabalhos, abrindo mão lançar álbuns com regravações porcas ou coletânea atrás de coletânea, com uma ou duas músicas inéditas, que provavelmente são sobras de estúdio esquecidas no fundo da gaveta.
Enfim, Ivy é bom? Se você não conhece Elisa bem, vai achar bom, pois as músicas são boas. Se acompanha a carreira por alto, é possível que sequer note diferença entre as regravações e os originais da cantora. Se é fã, vai se decepcionar. Eu esperava mais dessa sequência velada do Lotus, este sim um ótimo álbum de releituras e covers, com duas inéditas também muito boas. A Elisa que eu admiro, ótima cantora, compositora competente, capaz de fazer um rock pesado tão bem quanto uma doce canção de ninar, não está presente em Ivy. O que me resta é esperar que ela volte o mais breve possível.

Melhores Músicas: Anche tu, anche se (non trovi le parole), Ho Messo Via, I Never Came.
Piores Músicas: As desnecessárias releituras de Ti Vorrei Sollevare, Una Poesia Anche Per Te, Qualcosa Che Non C'È e Rainbow.
Nota: 5.0

Nenhum comentário: